quinta-feira, 2 de maio de 2013

UM SER: ACOLHEDOR, HUMANO E ACESSÍVEL

Alto, elegante, simpático, sorridente, paciente com a mídia! Estamos falando do Doutor Ricardo Tadeu Marques da Fonseca que, nos primeiros três meses de vida teve comprometimento na visão. Determinado entrou na faculdade de Direito e antes de completar o curso perdeu a totalidade de sua visão. Através de seus amigos (grifos meus) continuou a estudar com material gravado pelos colegas. Terminou a Faculdade com méritos porém, teve dificuldades com o mercado de trabalho. Não tardou muito um juiz de direito apontou-lhe alguns caminhos. Doutor Ricardo Tadeu permaneceu estudando e optou pelos concursos públicos estaduais e federais* Continuem lendo...

Posse do Dr. Ricardo Tadeu Marques da Fonseca - Desembargador do TRT, 9ª Região - discurso proferido por Maria Aparecida Gurgel

" Hoje, 17 de setembro de 2009, Dr. Ricardo Tadeu toma posse no cargo de desembargador do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região, em vaga reservada ao quinto constitucional. Membro do Ministério Público do Trabalho, ao longo de mais de uma década, teve atuação impecável no cumprimento das atribuições constitucionais. Sua Excelência teve sempre espírito arrojado na busca de soluções para as centenas de denúncia de violação de direitos dos trabalhadores e de conflitos coletivos entre empregados e empregadores, que lhe couberam atuar.

Poderia seguir adiante com vários adjetivos que qualificam a atuação de Sua Excelência. Hoje porém, atrevendo-me a ir além da representação institucional do Ministério Público do Trabalho pois me sinto ligada ao Dr. Ricardo Tadeu por laços não só de coleguismo como também de amizade, gostaria de compartilhar e celebrar com este egrégio Tribunal, autoridades, advogados, amigos e família, a oportunidade conferida a um cidadão, sensível e humanista, creditando a Sua Excelência a plena capacidade para o exercício dos misteres do encargo de juiz.

Retransmito ao Dr. Ricardo Tadeu os cumprimentos dos procuradores e da Procuradoria Geral do Trabalho, além dos Ministérios Públicos Estaduais e Federal aos quais Sua Excelência está ligado por atuação associativa na defesa dos direitos das pessoas com deficiência e idosos. Adiciono a este momento a convicção de que a magistratura brasileira ganhou e se transformará, sobretudo em suas práticas e ambientes. Essa transformação que agora se inicia terá a colaboração de Dr. Ricardo Tadeu, da mesma maneira e intensidade com que Sua Excelência colaborou para transformar o Ministério Público do Trabalho em um ambiente de trabalho acolhedor, humano e acessível."

"A ratificação da Convenção da ONU (Organização das Nações Unidas) sobre os direitos da Pessoa com deficiência, com status constitucionais, propiciou uma eficiente ferramenta para a transformação social que desejamos. Trouxe, porém, maior responsabilidade para os agentes políticos, que devem fazer cumprir a força normativa daquele tratado. Nisso, estamos efetivamente juntos"  
Dr. Ricardo Tadeu




“Na vida há momentos difíceis, 
mas não podemos desistir.”

O nascimento prematuro, aos seis meses de gestação, resultou em paralisia cerebral e perda parcial da visão. Aos 23 anos, Dr. Ricardo Tadeu Marques da Fonseca ficou cego, quando cursava o terceiro ano da faculdade de Direito. Conseguiu se formar com apoio dos colegas e depois enfrentou preconceitos e dificuldades para conseguir o primeiro emprego. Chegou a ser reprovado, há 20 anos, no concurso para juiz do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo, justamente por ser cego. Em seguida, passou no concurso para procurador do Trabalho. Hoje, é o primeiro juiz cego da história do Brasil. Confira entrevista em que destaca sua trajetória de perseverança e conquistas.

AME - Como ficou cego e como foi sua escolarização?
Dr. Ricardo Tadeu - Eu nasci há 50 anos, depois de um parto prematuro de seis meses. Tive paralisia cerebral. Então eu tenho uma deficiência nas pernas e tive baixíssima visão até os 23 anos, quando perdi totalmente a visão. Eu fui alfabetizado pela minha mãe. Ela me ensinou a escrever e a fazer contas em papel de pão, porque eles eram grandes e era preciso escrever com letras grandes para eu ler. Na escola eu tive professoras fenomenais que escreviam os textos com letras maiores para eu poder ler. A minha família achava que eu tinha que estudar numa escola comum. Inclusive eu jogava bola com a molecada. Era grosso, mas jogava. Sempre fiz tudo, brigava, apanhava, batia...

AME - Como foi o vestibular e como fez para se formar?
Dr. Ricardo Tadeu - A Fuvest na época não sabia como fazer a prova pra mim. Eu propus que eles gravassem as questões em fita cassete, eu ouviria e escreveria as respostas. Foi assim que fiz as provas e passei no Largo São Francisco. No terceiro ano fiquei cego. A minha turma, de 1984, foi muito legal. Cada colega escolheu um livro que gostava mais e gravou o conteúdo em fita cassete. Eles leram para mim. Eu escutava tudo e fazia as provas oralmente. Assim eu me formei, fiz mestrado na USP e doutorado na Universidade Federal do Paraná.

AME - Na prática, como foi sua atuação na Procuradoria durante 18 anos?
Dr. Ricardo Tadeu - No começo eles não sabiam como lidar comigo. Depois, passaram a me disponibilizar tudo o que precisava. Continuo trabalhando com ledores, que leem todos os processos e eu dito o que deve ser escrito. Eu participei de audiências de instrução de inquérito em que ouvia as testemunhas. Devo ter ingressado com dezenas de ações civis públicas, inclusive com provas que eu colhi. Todas foram julgadas procedentes. Instruí centenas de inquéritos civis. E nessa instrução eu presidia audiências em que tomava depoimentos de testemunhas. Eu sempre percebia que a testemunha estava vacilante por causa do tom da voz. Isso nunca foi problema para mim. Aí, apertava e conseguia a verdade. Sempre instruí muito bem meus inquéritos. Eu ouço a respiração, o tom de voz. Percebo quando a testemunha se mexe na cadeira, se está à vontade, se está nervoso, tudo isso detecto pela voz.

AME – Como será a prática como juiz no Tribunal Regional do Trabalho?
Dr. Ricardo Tadeu - Os desembargadores têm assessores. Eu preciso do mesmo número de assessores. E com o tempo quero me adaptar ao programa de leitura de voz de computador que lê tudo o que está na tela, porque os processos serão digitalizados. Aí nem de ledor humano precisarei mais. É uma questão de tempo. É só as pessoas olharem o processo de escolha dos desembargadores e analisarem os currículos. Participei dessa campanha em igualdade de condições com os meus colegas e confiei no meu currículo. Acho que tenho qualificação para o cargo. Todos elogiaram o meu currículo. Houve um depoimento de um juiz que disse: “Eu entrevistei o Ricardo e tinha dúvida se era possível ele ser um juiz, porque não queria contratá-lo por conta da falta de visão nem impedi- lo por isso. Então precisava ser convencido. E ele me convenceu.”

AME – Quais são seus planos para o futuro?
Dr. Ricardo Tadeu - Eu já sou um homem realizado. Como procurador, fiz tudo o que eu queria. Ajudei as pessoas com deficiência, ajudei a combater o trabalho infantil. Fiz muita coisa. Cheguei à magistratura para realizar um sonho que tive no início da carreira e me foi negado. Não tenho mais grandes ambições. Quero ser um juiz sensato, sábio e justo.

AME – Poderia deixar uma mensagem a nossos leitores?
Dr. Ricardo Tadeu - As pessoas são diferentes. Todo mundo é aparentemente igual, mas cada um traz em si um universo de diferenças, e essas diferenças podem ser físicas, sensoriais ou mentais. Mas em toda parte do mundo há pessoas plenamente adaptadas, o que prova que o ser humano supera as adversidades, basta que tenha os instrumentos para isso. Para a pessoa com deficiência tenho uma mensagem especial: não acredite nos limites que querem lhe impor

Entrevista concedida ao Portal AMEAssociação Amigos Metroviários dos Excepcionais


Indicação de Leitura: A ONU e o seu conceito revolucionário de pessoa com deficiência

* Texto de Iracema Alves

Iracema Alves /jornalista cadeirante
Colaboração Wiglinews

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