terça-feira, 3 de setembro de 2013

"NÓS ESTAMOS DEMARCANDO A TERRA COM NOSSO SANGUE", AFIRMA KAIOWÁ GUARANI"


Cerca de 300 indígenas participaram do Aty Guasu, grande reunião Kaiowá e Guarani do Mato Grasso do Sul, entre os dias 22 e 27 de julho de 2013, na aldeia Jaguapiru, município de Dourados. Intitulada “Ñanderu Mo Mbarete”  a assembleia marcou o reencontro de quase uma centena de rezadores e rezadoras indígenas, que há mais de 10 anos não se reuniam. Ao lado de caciques, mulheres, lideranças, professores e trabalhadores da saúde e jovens, os indígenas mais uma vez reafirmaram sua  principal urgência: a demarcação de seus territórios tradicionais.  São terras marcadas pela violência, mas sobretudo, pelas possibilidades de vida traduzida hoje em luta e reencontros com fragmentos culturais longe da poeira dos museus ou livros de história. Os rezadores explicam que não se chama mais de Nanderu e Nandesy - homens e mulheres rezadores, respectivamente. "Redescobrimos uma palavra antiga. Nosso nome agora é Tekoa' ruvixa porque nós damos a vida a "palavra antiga", conta Getúlio Juca, anfitrião do Aty Guasu. 
A espiritualidade dos Guaranis e Kaiowá, portanto é calcada na realidade em que vivem. Entre o reencontro com a "palavra antiga", a troca de cantigas e de experiências, toda a discussão circundava a questão da demarcação das terras indígenas - leia na íntegra a carta dos rezadores e rezadoras do Aty Guasu Nanderu Mo Mbarete.

Aos caciques  e lideranças coube a tarefa de formatar a discussão dos Tekoa'ruvixa em pauta de reivindicações, apresentada à presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai). Maria Augusta Assirati. Presente no penúltimo dia do encontro, acompanhadas das coordenadores regionais do órgão no Mato Grosso do Sul, Maria Augusta ouviu críticas severas dos indígenas à morosidade na demarcação das terras Guarani e Kaiowá.

"O ouvido de vocês está cansado. E a gente também esta cansada de falar a mesma coisa", desabafou a professora Léia Aquino, de Nanderu Marangatu. Anos e anos passam e a gente não consegue ver resultado de nada", disse - veja a pauta completa de reivindicações do Aty Guasu Nanderu Mo Mbarete .

Denúncias sobre a falta de professores, salas de aula, merendeiras, agentes de saúde, ambulâncias, combustível, medicamentos, verbas dentistas, politicas públicas para jovens e segurança; ataques de pistoleiros, impunidade nos casos de assassinato, discriminação e preconceito em escolas municipais, desmatamento e envenenamento por agrotóxicos, entre outros, foram relatadas à Funai. "Todos esses problemas acontecem porque não temos a terra. A terra é a nossa vida. É só com elas que vamos começar a melhorar", afirmou Léia. Tudo porém, permeia a falta de acesso ao território e a lentidão dos processos demarcatórios. a presidente Maria Augusta concordou: "...nada de bom pode acontecer se a gente de fato não der acesso", disse aos indígenas. "Só que isso não depende só da Funai. Depende de outros poderes - a começar pelo pode público estadual, pelas pessoas que tem fazendas aqui. {Elas} precisam se abrir pra esta discussão - sem preconceito, sem discriminação, sem achar que o seu próprio direito,o direito dos fazendeiros, é o único direito que existe no mundo. Porque não é", enfatizou.

Apesar de reconhecerem a boa vontade da coordenação federal da Funai, para a nação Guarani, nada de novo foi apresentado pelo órgão indigenista. "Mais um dia eu vejo o sol brilhar, e mais um dia eu vejo as autoridades presentes não trazendo nada para nós, sobre a nossa terra, dizendo: essa área foi identificada. essa área aqui já foi homologada. Ninguém trouxe papel aqui" respondeu Ládio Veron. Para os indígenas, nada mais do que sofrer e não demarcar as terras, os Guaranis e Kaiowá estão perdendo território. "...perdemos para o branco antes, e agora perdemos para a soja, cana, braquiara e boi", compara o indígena Jorge Gomes"Eu não li a Constituição toda, mas onde eu parei de ler, não achei nada escrito que tem que tirar o índio das terras dele, o índio tem direito de retornar novamente pra terras deles". A expectativa dos Guarani e Kaiowá  e de que o governo federal  apresente uma proposta, até o dia 5 de agosto (pp), que dê cabo do conflito fundiário que tem levado milhares de indígenas à miséria no Mato Grosso do Sul. "Nós temos respeitado o acordo com o governo e estamos aguardando num indicativo concreto de que o problema da demarcação de terras realmente apareça até o dia 5 de agosto de 2013", comenta a liderança indígena Otonel Ricardo, do Conselho Continental da Nação Guarani.

Na última semana o Conselho Nacional de Justiça - CNJ apresentou um relatório que sugeriu seis possíveis soluções para o conflito fundiário no Estado. O professor Anastácio Peralta, membro da comissão, relata uma tentativa sorrateira de inclusão de pautas contrárias à posição dos indígenas no documento. "Tentaram  colocar o apoio do Projeto  de Lei complementar 227 no relatório. Não se sabe quem foi, mas foi pelas nossas causas. Isso é um absurdo", afirmou. "nós estamos demarcando a terra com nosso sangue", disse Valdenice Veron à presidente da Funai  ao final do discurso. "não  podemos esperar mais. Não aceitaremos mais outro prazo (além do dia 5).  Nós não vamos recuar. E todo derreamento de sangue Guarani e Kaiowá, de Terena do Mato Grosso do Sul, a Dilma será a maior culpada, conclui.

Fonte: Reportagem de Ruy Sposati (publicada pelo portal do CIMI , em 1/8/2013)

Apresentação de relatório sobre demarcação de terras indígenas é adiada para quarta-feira 04/09 - estaremos monitorando

Iracema Alves / jornalista cadeirante  (estou em plena recuperação de saúde. Obrigada aos amigos.)
Participação de Wiglinews

Entenda demarcações de terras indígenas e conflito com proprietários rurais


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