domingo, 20 de outubro de 2013

"TODO O UNIVERSO INDÍGENA ESTÁ A PERIGO"

"Historicamente, os governos de centro ou esquerda ou direita, seja qual for a tendência, sempre foram contrários aos índios, afirma Sydney Posselo  que foi presidente da Funai durante o governo Collor. Possuelo foi o responsável pela demarcação da terra indígena Yanomami. É tido como criador do departamento de índios isolados da Funai ( atual Coordenação Geral de Índios Isolados e de Recente Contato), responsável por institucionalizar a postura de não-contato com os povos indígenas em isolamento voluntário.
A entrevista é de Felipe Milanez e publicada por Carta Capital, em 02/10/2013
Segundo ele, de um modo geral, a sociedade nacional nunca gostou de índio. Hoje, se soma a essa postura histórica de nunca gostar e  não respeitar a ação governamental que se alia aos tradicionais inimigos dos povos indígenas.
IHU-O que está acontecendo hoje, como explicar esse ataque aos direitos indígenas?
Felipe: Como foi dito por Sydney Possuelo, de modo geral, a sociedade nacional nunca gostou de índio. Hoje, se soma a essa postura histórica, a ação governamental que se alia aos tradicionais inimigos dos povos indígenas. O agronegócio no Brasil, está aliado ao governo. O governo está mais desmatando mais que tudo. As grandes obras nacionais, hidrelétricas, que também se aliam ao governo porque é o governo que está fazendo. Há um monte de ONGS que dependem do governo, e elas não têm mais voz. Dentro da Funai não se encontra mais nenhum defensor dos índios. Aquela Funai antiga que vários companheiros faziam da Funai um órgão de luta de defesa dos povos indígenas, hoje não existe mais. Há uma convergência de fatores tradicionalmente anti-indíginas e todos convergem junto do governo por interesses. Uma situação que faz recrudescer a tradicional indiferença nacional com os povos indíginas. E contra os índios o agronegócio, o grande desenvolvimento são as obras a qualquer preço.Essas convergências se misturam com a ausência de pessoas e fatores,;a própria imprensa que antigamente era mais atuante a favor dos povos indíginas. Na imprensa de um modo geral, os artigos são contra os povos indígenas. Não se tem vozes nacionais que se levantem na defesa. Todos calados alimentando esse processo do governo com suas obras, a ideia do "Brasil grande" que precisa se desenvolver.
IHU- Qual a ameaça dessas mudanças legislativas PEC  215 (Plano da Expansão do Crescimento) e (PLP 227) para o futuro?
Felipe - Os índios estão mais ameaçados; antigamente a esperança era maior porque tínhamos muita atividade indigenista. Demarcávamos terras, bastante vozes se levantavam na imprensa, grupos de Entidades falavam sobre os povos indígenas. Existia mais esperança, hoje é o contrário. A esperança diminui e aumenta as dificuldades para os povos indíginas. O resultado ´é que desde 1.500 até hoje, com pequenos momentos mais leves da nossa política, todo o processo ameaça os povos indíginas. A sociedade até entende mas a ganancia e a possibilidade de ganhar dinheiro e fazer negócios predominam. Fatores que atuavam isoladamente hoje estão todos juntos. Todo mundo em volta do governo. que é o elemento que converge esses interesses, que subordina a todos .Eu vejo esse governo como um dos mais nefastos com relação aos povos indíginas, desde a entrada do Lula até hoje. A postura é: vamos desenvolver! O índio permanece sendo o entrave.
IHU - Como esse processo de força contrário aos índios se tornou tão poderoso e influente?
Felipe: O polarizador foi o governo com bilhões de reais ele fez estradas, e quem faz a estrada a favor do governo, é a empreiteira, o governo deixa desmatar -"autoriza". E o governo alimenta essa situação porque o que eles querem é a produção de mais carne, de mais soja para mais gente criar boi na Europa e na China. Os interesses do governo convergem com parte da sociedade nacional, os construtores de estadas, os chamados desbravadores.
IHU - O que pode ser feito? Ou o que deveria se feito no Brasil?
Felipe: Não é simples e não basta simplesmente mudar o governo. Historicamente os governos de centro ou esquerda ou direita, seja qual for a tendência, sempre foram contrários aos índios. Uns mais outros menos. Não acredito que venha um governo de centro ou de direita que vai transformar. É uma coisa incorporada à nossa sociedade por vários motivos  históricos. Como vamos ter um órgão a favor dos índios se o governo não se porta a favor dos índios? E não falo só do Federal mas o Estadual e  Municipal: todos são contrários aos índios. Na época das demarcações que fizemos nos meu dois anos de presidente da Funai, tivemos uma ação demarcatória muito positiva, no governo Collor. Em um ano duplicamos a superfície de terras indíginas no Brasil. Houve momento em que esta situação estava melhor...como voltar a uma atividade mais respeitosa. Como respeitar os povos indíginas se a gente não se respeita? Somos uma sociedade que tem de caminhar muito!.
IHU: E como está a situação dos povos indíginas isolados, tema com o qual o senhor Sydney Possuelo trabalhou durante tantos anos?
Felipe: A situação dos índios  isolados está igual a dos outros povos: de mal a pior; tudo aquilo que foi feito com a criação do departamento de índios isolados, com seis ou sete equipes funcionando, mantendo a terra dando um pouco de sossego para os índios tudo aquilo se perdeu. Perdeu-se a motivação porque não tem mais aquelas pessoas que foram anuladas e mandadas embora; a começar por mim: Sydney Possuelo, mas todos  contribuíram de alguma forma. Antes da criação desse departamento e toda a filosofia que implantei, cada qual fazia aquilo que queria. Fizemos uma filosofia de não contato porque são sociedades vulneráveis e, somos tão grande, porque não sermos um pouco generosos deixá-los  nas sua áreas? As frentes estão abandonadas, não tem pessoas motivadas trabalhando nelas. os índios isolados estão tão a perigo quanto os que estão contatados. Todo o Universo indígena está a perigo, inclusive os isolados. Eu não consigo ver lados positivos em qualquer desenvolvimento que não respeite as populações diretamente afetadas, que não considere elas, que não faça obras de atenuação dos impactos. Impactos sempre vão ocorrer mas convém atenuar. Senão não é desenvolvimento nem sustentável nem ético.
Fonte : Instituto Humanistas Uníssimos
Estamos monitorando a situação indígena e continuaremos a fazê-lo. Ver texto neste blog / 3/9/2013 
Iracema Alves / jornalista cadeirante
Participação de Wiglinews

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