TSE e Ministério Público cruzam dados dos candidatos para obter informações levantar sobre quem foi réu em processo ou teve gestão pública reprovada.
A reportagem é de Hylda Cavalcanti e publicada por Rede Brasil Atual – RBA, 07-07-2014.
Passadas as convenções partidárias, com as homologações dos nomes de todos os candidatos e iniciado, de fato, ontem (6), o período eleitoral, os próximos dias são de trabalho, por parte do Ministério Público e Tribunal Superior Eleitoral (TSE), para fazer o cruzamento de dados entre as listas dos tribunais referentes a políticos e agentes públicos processados. Quem foi condenado em alguma ação terá a candidatura automaticamente impugnada peloTSE até o final da semana.
Conforme cadastro mantido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que reúne dados de condenações de políticos e agentes públicos de todos os tribunais, existem no Judiciário brasileiro mais de 14 mil processos em que houve condenação de políticos. Somente o Tribunal de Contas da União, incluiu na lista 6.600 gestores públicos com contas reprovadas – que também são suscetíveis de impugnação, caso tenham se candidatado.
Somando-se tudo isso, há ainda as listagens de cada tribunal de contas estadual a serem enviadas para o TSE. Um trabalho que, de acordo com avaliação de analistas judiciários, se estimado por baixo, resultará em mais de 2 mil candidaturas impugnadas. Nas últimas eleições, em 2012, foram 1.200 as impugnações de candidatos por ficha suja.
Já se sabe que, do total de 14.175 políticos com a ficha suja, a maior parte dos nomes está concentrada em São Paulo, Distrito Federal, Paraná e Minas Gerais. São Paulo dispara na frente com 2.903 deles. O Distrito Federal tem 2.515 nomes de condenados entre políticos e gestores públicos. O Paraná tem 1.581 políticos condenados e Minas Gerais 1.262 deles. Caberá, a partir de agora, ao Ministério Público Eleitoral, checar os nomes de todos os políticos que registraram candidaturas e repassar tais informações ao TSE.
A parceria entre os órgãos para inclusão destes nomes num cadastro único possibilita maior controle sobre a situação de candidatos a cargos eletivos”, afirmou o conselheiro do CNJ encarregado do cadastro, o promotor Gilberto Martins.
Segundo ele, nas últimas eleições, muitas candidaturas não foram impugnadas por falta de informação ao Judiciário, Ministério Público Eleitoral e partidos políticos. "Descobriu-se, depois, que o candidato foi registrado e eleito, mas tinha, desde a origem, condenação que teria gerado inelegibilidade. Situações semelhantes serão evitadas a partir da alimentação e consulta a esse cadastro”, disse. De acordo com o conselheiro, as condenações em cortes de contas são as que mais resultam em casos de inelegibilidade.
Como a lei dá ao MP apenas prazo de cinco dias para avaliar as candidaturas após o final das convenções, muitos analistas acreditam que o período é curto para cruzar tantos dados e poderá ocorrer de muitos destes nomes condenados virem a manter a candidatura. Nesse caso, os pedidos de impugnação poderão ser solicitados por terceiros ao TSE e decididos pelo tribunal após alguma ação ou recurso.
Aplicação prática
A aplicação da Lei da Ficha Limpa terá, nesta eleição, a aplicação prática, já que nas eleições de 2012, quando passou a ter validade, muita gente que disputou eleições para prefeito ou vereador entrou com ação no TSE, contestando a inclusão entre os nomes e argumentando serem réus em processos que ainda não tinham transitado em julgado (processos já totalmente concluídos).
Este ano, com as regras mais claras, muita gente desistiu da candidatura ou resolveu arriscar e formalizá-la, mas já com a expectativa de receber a impugnação do TSE. Apesar disso, técnicos e magistrados avaliam que, ainda assim, devem ser apresentados muitos recursos ao tribunal.
“Muita gente deixou para se candidatar no final do prazo justamente como estratégia para burlar a lei e isso vai exigir bastante cuidado por parte dos órgãos que receberam a missão de cruzar dados para que o trabalho não provoque injustiças e, por outro lado, para que não deixem passar nomes já condenados judicialmente”, declarou o advogado e analista judiciário Hélio Dourado, servidor do TSE.
Dentre os deputados federais, por exemplo, pelo menos oito nomes são citados entre os que possuem ficha-suja nas listagens. Levantamento feito pela ONG Transparência Brasil em março passado, destaca dentre os parlamentares que tiveram ações contra eles transitadas em julgado pelo menos oito deles: Marcos Montes (PSD-MG), Abelardo Camarinha (PSB-SP), Antonia Lúcia (PSC-AC), Chico das Verduras (PRP-RR), Edinho Araújo (PMDB-SP), Emanoel Fernandes (PSDB-SP), Fernando Jordão (PMDB-RJ) e Paulo Maluf (PP-SP).
O fator ‘Arruda’
Muitos dos nomes encontram brechas na legislação porque se a ação da qual são réus não foi totalmente concluída e couber a apresentação de novos recursos, eles não poderão ter candidatura impugnada. Essa é uma regra, por exemplo, da qual muitos se valem.
O exemplo mais recente é a candidatura do ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda às próximas eleições. Arruda foi flagrado recebendo propina em vídeo amplamente divulgado, chegou a ser preso por participação em esquema fraudulento de desvio de recursos e perdeu o mandato de governador. Mesmo assim, se vale de decisão tomada recentemente que autorizou a segunda instância de julgamento do processo que tramita contra ele.
Caso não houvesse a autorização, o processo seria encerrado após julgamento do STJ e não caberia mais recurso, o que o colocaria imediatamente entre os listados na ficha suja e impedido de se candidatar. Contudo com a autorização para que ele possa recorrer a uma segunda instância – no caso, o STF – Arruda passou a ter o direito de se candidatar.
O que diz a lei
Sancionada após tramitar no Congresso mediante um projeto de iniciativa popular, a Lei da Ficha Limpa incentiva o voto consciente do eleitor, mostrando a importância de se conhecer o passado dos candidatos, baseado no comportamento e ações.
A legislação considera inelegíveis para as eleições dos próximos oito anos, contados a partir da decisão judicial, todos aqueles que figurarem como réus em ações encerradas no Judiciário, bem como os que tiverem as contas de exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável com ato doloso de improbidade administrativa e por decisão irrecorrível do órgão competente, salvo se houver sido suspensa ou anulada pela Justiça.
O autor da Lei da Ficha Limpa, juiz Marlon Reis, vê como positiva essa parceria entre os órgãos para avaliar a situação dos candidatos, mas lembrou que, mais importante do que a legislação, é a conscientização e pesquisa individual a ser feita pelo eleitor.
“A ficha limpa é uma barreira para evitar candidatos com um passado sombrio, mas os eleitores também precisam saber quem são os candidatos em quem vão votar, pois a lei não é a última barreira”. Reis disse, também, que existem muitos candidatos com práticas erradas, mas que, como não têm condenações criminais na forma exigida pela lei, não poderão ser impugnados e têm direito à concorrer ao pleito. "Só mesmo os eleitores poderão repeli-los nas urnas”, frisou.
Fonte: IHU Unisinos
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