sexta-feira, 31 de julho de 2015

TRAVESSIA NO DESERTO

 Por Eliane Cantanhêde
Ao reduzir o superávit fiscal para 0,15% do PIB e anunciar cortes de R$ 8,6 bilhões no já tão retalhado Orçamento, o governo da presidente Dilma Rousseff simplesmente jogou a toalha. Foi o reconhecimento cristalino de que Dilma, Joaquim Levy e Nelson Barbosa não conseguem ajustar as contas, muito menos estancar a crise. Por mais que a presidente diga que 2015 é um ano de "travessia", a dura realidade é que este é um ano de recuos e de trancos para correção, ou tentativa de correção, de todos os erros crassos cometidos no primeiro mandato, pautado por uma visão embaçada e antiga sobre o que é nacionalismo e desenvolvimento.
O resultado é recessão, quando as empresas produzem menos, o comércio vende menos, os serviços operam menos e todos pagam menos impostos. E o governo, que gastou muito, continua gastando muito. Como em qualquer lar, se você gastou mais do que devia, endividou-se e não ganha o suficiente para arcar com as despesas...dá nisso. O governo não fecha as contas, não consegue mais economizar para amortizar suas dívidas, é obrigado a rever a meta fiscal e a "cortar na carne", como repetiu Levy na entrevista do anúncio.
Se já cortaram R$70 bilhões no Orçamento, uma das grandes dificuldades agora é definir onde ainda há o que cortar. Gordura não há mais, enxugar o número de ministérios é fora de cogitação e o que sobra é uma escolha de Sofia! Educação ou Saúde? Defesa ou Desenvolvimento? Relações Exteriores ou Agricultura? Aparentemente, poucos passarão ilesos, tanto que o governo quer maior flexibilização para  mexer até nos gastos, digamos, imexíveis.
E aí entra a questão mais delicada. Dilma, Levy e Barbosa, aparentemente, esqueceram de um detalhe no anúncio da mudança de meta fiscal e dos cortes: combinar com os adversários. Essas são medidas que o governo anuncia e o Congresso vota. E vai num clima político e econômico péssimo, com a Lava Jato correndo solta e o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, voltando do recesso de tacape em punho.
Enquanto a oposição aponta o dedo para culpar Dilma por mais esse jeitinho para fechar as contas públicas sem fechá-las, o governo reage lembrando a parcela bem razoável de responsabilidade do Congresso e da oposição nesse latifúndio de culpas. Os dois lados estão cobertos de razão: Dilma criou o problema, o Congresso dificultou a solução
A crise começou com o desconhecimento, a ideologia antiquada e a empáfia de Dilma, mais deputados e senadores complicaram ao máximo as votações de ajuste fiscal e foram reduzindo, uma a uma, as previsões de receitas com as mexidas previdenciárias e trabalhistas e simplesmente não votaram nem na redução da desoneração fiscal das empresas nem do repatriamento de recursos do exterior. Ou seja: a arrecadação continuou caindo, mas a receita não aumentou tanto quanto nos planos de Levy. E tome crise...
Dilma empurrou o conteúdo econômico para Levy e Barbosa e o conteúdo político para o vice Michel Temer, enquanto trata de cuidar da própria forma. Não apenas da forma física, com regime da moda e as pedaladas, mas também da forma de se comunicar com a opinião pública que lhe é hostil. Assim ela foi aos EUA, à Rússia e à Itália, sediou reunião do Mercosul em Brasília, tem ao menos uma viagem por semana aos Estados, concede uma entrevista daqui outra dali. Mas não há marqueteiro que dê jeito em crises, não há propaganda que encha a barriga, nem mandioca que gere emprego.
O primeiro semestre foi um desastre? Pois o segundo não será melhor. Como diz o ditado, nunca está tão ruim que não possa piorar...
Recordar é viver: Os bombeiros estão em ação, mas não custa lembrar que, em entrevista ao Estado em 10 de março pp, sua primeira exclusiva sobre a crise, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso disse com todas as letras (acentuadas pela mágoa) que não faria acordo nem tinha nada a tratar com seu sucessor Lula:
"Ele quer é acusar. Ele é o bom, nós somos os maus. Então, não há como dialogar com quem não quer dialogar".
Fonte: Eliane Cantanhêde: Colunista do Jornal O Estado de São Paulo.
           Obrigada pela sua presença
           Um abraço
           Iracema Alves
           Jornalista Cadeirante

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